v. 3 n. 8 (2017): História e Correspondência
Em um mundo de comunicação instantânea possibilitada pelas tecnologias da informação e comunicação, talvez soe estranho o interesse de historiadores pelas correspondências em seus mais variados estilos e épocas. Distância e ausência são, até os dias atuais, motivos para a efetivação do ato de escrever cartas, de se corresponder. As cartas, como os e-mail’s e mensagens enviadas por aplicativos como o whatssap, movem-se entre a presença e ausência, ao mesmo tempo em que à distância, mantemos os vínculos. Forma utópica da conversa, registro particular do mundo, a troca de cartas, cuja origem se perde na antiguidade, atingiu o auge na Europa Ocidental, como forma de escrita pessoal, durante os séculos XVIII e XIX, e como consequência do processo maciço de alfabetização. Cartas são necessariamente escritas para um destinatário, seja uma única e particular pessoa, seja um conjunto maior de leitores, conhecido ou não pelo remetente que, por sua vez, também pode ser um indivíduo ou um coletivo. De maneira geral, cartas são escritas para serem lidas por certa pessoa, selando um “pacto epistolar” abarcando assuntos variados e até íntimos e um pouco secretos. Nesses casos, elas podem ser cuidadosamente guardadas pelo destinatário, como um bem de valor afetivo incomensurável, como um “objeto de memória”. Contudo, não é incomum que, justamente pelas mesmas razões, elas sejam destruídas (até a pedido do remetente) ou sejam mantidas a distância de qualquer outro leitor, como se uma aproximação indevida pudesse implicar invasão de privacidade, não importando a distância decorrida entre o momento da escrita da carta e o da leitura efetuada. A concepção desse dossiê surgiu a partir de nossos interesses em articular História e Correspondência, por ser este um campo em que temos atuado, por considerarmos bastante profícuo para a compreensão da produção Intelectual. Campo que vem sendo bastante praticado, sobretudo contemporaneamente, na academia a partir da disponibilização dos acervos privados de intelectuais que mantiveram a prática epistolar. No entanto, ressalte-se que a prática epistolar pode ser localizada já nas sociedades do antigo Oriente Próximo, na Grécia Helênica, no império Romano, no medievo romano-germânico, etc. Há, sem dúvida, uma vasta documentação que se apresenta ao historiador interessado em produzir biografias privadas, intelectuais, políticas, dentre as muitas outras dimensões que este tipo de fonte congrega. Assim, o dossiê teve como objetivo maior juntar artigos e pesquisadores que focalizem o contato entre História e correspondência, propondo-se, portanto, a explorar os múltiplos aspectos da correspondência, a partir dos resultados de investigações que aprofundem o uso dessa fonte como objeto da produção historiográfica.